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domingo, 22 de março de 2020

REPERCUSSÃO JURÍDICA DA COVID-19

Neste momento de tensão a melhor opção é tentar aprender algo com a situação. Então, no universo de informação que se tem sobre a pandemia do coronavírus, a covid-19, e diante da imprecisão de muitas das informações repassadas especialmente através de redes sociais, opta-se pela informação qualitativa, obter conhecimento e utilizá-lo para orientar a coletividade neste momento de dificuldade.
O presente estudo parte da ideia do Dr. Fábio Roque, juiz federal que possui um canal do YouTube no qual dispõe conteúdo jurídico de qualidade e gratuito. Lá há dois vídeos bem interessantes tratando da repercussão jurídica do coronavírus. Aos que se interessarem em conferir esta importante colaboração jurídico-social do Dr. Fábio Roque, segue o link: https://www.youtube.com/channel/UC9SLIJwKyOniJXUUiItxS7w/videos.
 É, também, uma tentativa de sintetizar os comandos legais da Lei nº 13.979/2020, da Portaria Ministerial nº 356/2020, do Ministério da Saúde, e da Portaria Interministerial nº 5/2020, dos Ministério da Justiça e Segurança Pública e da Saúde, objetivando produzir um material que possa servir “de norte” para a população e profissionais de saúde que ainda não conhecem ou ainda não estudaram estes dispositivos legais.
As duas portarias retromencionadas regulamentam a Lei nº 13.979/2020, ou seja, explicitam como esta será concretizada, aplicada. Esta, de 20 de fevereiro de 2020, é chamada de “Lei Coronavírus”, e “Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus reponsável pelo surto de 2019”. É neste dispositivo normativo que se encontra conceitos importantes que estão sendo aplicados pela Administração Pública no desenvolvimento das políticas de enfrentamento imediato desta situação de pandemia, dentre outras a ideia de “isolamento” e “quarentena”. Sobre estes, o art. 2º da Lei nº 13.979, traz o que segue “in verbis”:
Art. 2º  Para fins do disposto nesta Lei, considera-se:
I - isolamento: separação de pessoas doentes ou contaminadas, ou de bagagens, meios de transporte, mercadorias ou encomendas postais afetadas, de outros, de maneira a evitar a contaminação ou a propagação do coronavírus; e
II - quarentena: restrição de atividades ou separação de pessoas suspeitas de contaminação das pessoas que não estejam doentes, ou de bagagens, contêineres, animais, meios de transporte ou mercadorias suspeitos de contaminação, de maneira a evitar a possível contaminação ou a propagação do coronavírus (grifo nosso).
Os conceitos acima são amplos, não se restringindo apenas aos efetivamente doentes, mas aos contaminados, seus bens, etc. O que se objetiva com estas medidas é realizar o interesse público mesmo que, neste momento excepcional, seja necessário, dentre outras, a restrição da liberdade individual das pessoas.
As medidas que poderão ser adotadas pelas autoridades, no âmbito de suas competências, para o enfrentamento da emergência em saúde pública decorrente do coronavírus encontram-se especificadas no art. 3º da Lei nº 13.979/2020, que segue “in verbis”:
Art. 3º  [...]
I - isolamento;
II - quarentena;
III - determinação de realização compulsória de:
a) exames médicos;
b) testes laboratoriais;
c) coleta de amostras clínicas;
d) vacinação e outras medidas profiláticas; ou
e) tratamentos médicos específicos;
IV - estudo ou investigação epidemiológica;
V - exumação, necropsia, cremação e manejo de cadáver;
VI - restrição excepcional e temporária, conforme recomendação técnica e fundamentada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, por rodovias, portos ou aeroportos de:                (Redação dada pela Medida Provisória nº 926, de 2020)
a) entrada e saída do País; e            (Incluído pela Medida Provisória nº 926, de 2020)
b) locomoção interestadual e intermunicipal;      (Incluído pela Medida Provisória nº 926, de 2020)
VII - requisição de bens e serviços de pessoas naturais e jurídicas, hipótese em que será garantido o pagamento posterior de indenização justa; e
III - autorização excepcional e temporária para a importação de produtos sujeitos à vigilância sanitária sem registro na Anvisa, desde que:
a) registrados por autoridade sanitária estrangeira; e
b) previstos em ato do Ministério da Saúde.
Dentre as medidas ilustradas, aquelas que podem ser adotadas pelos gestores locais de saúde, desde que autorizados pelo Ministério da Saúde, são aquelas das hipóteses dos incisos I, II, V, VI, e VIII. A autorização destas já consta no art. 2º da Portaria Ministerial nº 356/2020, de 11 de março de 2020, do Ministério da Saúde. Outrossim, independentemente de autorização do Ministério da Saúde, os gestores locais já poderiam adotar as medidas dos incisos III, IV e VII do art. 3º da Lei nº 13.979/2020 supracitado.
Detalhe importantíssimo: são medidas que, se impostas, deverão ser obrigatoriamente observadas. Aqueles que as descumprirem poderão ser legalmente responsabilizados administrativa, civil e criminal.
A Portaria Ministerial nº 356/2020, de 11 de março de 2020, do Ministério da Saúde, no §1º do seu art. 3º, traz que a medida de isolamento será pelo período de 14 (quatorze) dias, podendo se estender por até igual período, conforme resultados laboratoriais que comprovem os riscos de transmissão. A medida de isolamento prescrita pelo médico será efetuada, preferencialmente, em domicílio. Entretanto, poderá ser feita em estabelecimentos públicos ou privados de saúde, a depender da orientação médica e do estado clínico do paciente.
Importante enfatizar que a medida de isolamento poderá se dar por prescrição médica ou recomendação do agente de vigilância epidemiológica ou, na falta deste, pelo Secretário de Saúde do ente federado. Aquela deverá ser acompanhada de termo de consentimento livre do paciente, conforme modelo constante no Anexo I da Portaria Ministerial nº 353/2020. Já a medida de isolamento por recomendação do agente de vigilância epidemiológica/Secretário de Saúde ocorrerá no curso da investigação epidemiológica e abrangerá somente os casos de contactantes próximos a pessoas sintomáticas ou portadoras assintomáticas, e deverá ocorrer em domícilio, conforme a previsão do §5º do art. 3º da Portaria em comento. Esta será feita por meio de notificação expressa à pessoa contactante, conforme o modelo constante no Anexo II da mesma Portaria Ministerial.
A previsão legal da compulsoriedade das medidas adotadas pelas autoridades públicas é objeto, também, da Portaria Interministerial nº 5, de 17 de março de 2020, dos Ministérios da Justiça e Segurança Pública e da Saúde. No art. 3º desta traz que o descumprimento das medidas previstas no art. 3ª da Lei nº 13.979, de 2020, acarretará a responsabilização civil, administrativa e penal dos agentes infratores.
A medida de quarenta objetiva garantir a manutenção dos serviços de saúde em local certo e determinado e será determinada mediante ato administrativo formal e motivado do Secretário de Saúde do ente federado, publicado no Diário Oficial e amplamente divulgado. Aquela será pelo período de 40(quarenta) dias, podendo ser prorrogado pelo período necessário para reduzir a transmissão comunitária e garantir a manutenção dos serviços de saúde no território, conforme as previsões do art. 4º da Portaria Ministerial nº 356/2020.
Descumprida a medida de isolamento ou a quarentena haverá a responsabilização legal do infrator, competindo ao médico ou agente de vigilância epidemiológica/Secretário de Saúde informar ao Delegado de Polícia e ao Ministério Público sobre o descumprimento das medidas ilustradas (Art. 5º, Portaria Ministerial nº 356/2020).
A Portaria Interministerial nº 5/2020, por sua vez, trata da compulsoriedade das medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública da Lei nº 13.979/2020, prevendo, dentre outras, que o descumprimento da quarentena, da realização compulsória de exames médicos, testes laboratoriais e tratamentos médicos específicos, medidas previstas no inciso I e inciso III, alíneas “a”, “b” e “e” do art. 3º da Lei nº 13.979/2020, a “Lei Coronavírus”, pode configurar os crimes de Infração de medida sanitária, art. 268, e desobediência, art. 330, ambos tipificados no Código Penal Brasileiro.
Ponto interessante da Lei nº 13.979 é que será considerada falta justificada ao serviço público ou à atividade laboral privada o período de ausência do cidadão em decorrência da aplicação das medidas do art. 3º e que sobre ele recaiam. Assim, se for determinado a realização de exames médicos e testes laboratoriais, os dias que o cidadão ficar ausente no seu trabalho serão considerados como falta justificada.
Registra-se ainda que as medidas de coleta de amostras clínicas, vacinação e outras medidas profiláticas, alíneas “c” e “d” do inciso III do art. 3º da Lei nº 13.979/2020, não dependem de indicação médica ou de profissional de saúde, conforme prevê o art. 6º, parágrafo único da Portaria Ministerial nº 356/2020, do Ministério da Saúde.
 Ainda no que se refere à atuação da Administração Pública no que concerne às licitações, a Lei 13.979/2020 prevê situação de dispensa destas para a aquisição de bens, serviços e insumos de saúde destinados ao enfrentamento da emergência de saúde pública em decorrência do coronavírus.
Aqui no Ceará o governador Camilo Santa, de forma acertada, publicou o Decreto nº 35.519, de 19 de março de 2020, que “Intensifica as medidas para enfrentamento da infecção humana pelo novo coronavíros”, que no seu art. 1º suspende, por dez dias, a partir da zero hora de 20 de março de 2020, passível de prorrogação, o funcionamento de bares, restaurantes, lanchonetes, templos, igrejas, cinemas, academiais, museus, lojas, feiras e exposições, etc. No §12 deste artigo há a previsão de aplicação de multa no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), sem prejuízo da adoção de medidas como a apreensão, a interdição e o emprego da força policial.
O presente estudo, apesar das limitações quanto ao rigor científico, pois que não era não interessava, inicialmente, produzir texto com rigor técnico, se configura como esforço imediato no sentido de colaborar com os cidadãos, profissionais ou não da área de saúde, objetivando demonstrar que atuação da Administração Pública se dá em observância dos princípios explícitos insculpidos no caput do art. 37 da Constituição Federal, especialmente o princípio da legalidade, sendo de fundamental importância tal compreensão para atuação concreta, consistente e consciente dos gestores de Saúde Pública e dos demais cidadão neste momento de tanta apreensão para o povo brasileiro. Neste momento, compreende-se, a informação é arma de grande monta ao esforço coletivo de evitar uma catástrofe humanitária.
Groaíras-CE, 21 de março de 2020.
Augusto Martins Melo

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAÚJO, Fábio Roque. Coronavírus – Repercussões Jurídicas. YouTube. Vídeo 1. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=jAIzv_KmAqY&t=1s>. Acessado em: 21, mar., 2020.
___________________. Coronavírus – Repercussões Jurídicas. YouTube. Vídeo 2. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=UMHeyKfRBaE>. Acessado em: 21, mar., 2020.
BRASIL. Lei nº 113.979, de 6 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019. Acessado em em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2020/Lei/L13979compilado.htm> Disponível em:21, mar., 2020.
________. Ministério da Saúde. Portaria nº 356/2020, de 11 de março de 2020. Dispõe sobre a regulamentação e operacionalização do disposto na Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, que estabelece as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (COVID-19). Disponível em: < http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-356-de-11-de-marco-de-2020-247538346>. Acessado em: 21, mar., 2020.
________. Ministério da Justiça e Cidadania e da Saúde. Portaria Interministerial nº 5,  356/2020, de 17 de março de 2020. Dispõe sobre a compulsoriedade das medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública previstas na Lei nº 13.979, de 06 de fevereiro de 2020. Disponível em: < http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-interministerial-n-5-de-17-de-marco-de-2020-248410549>. Acessado em: 21, mar., 2020.